Por que o dólar despencou e a Bolsa disparou nesta semana, em meio à covid?
sábado, 06 de junho de 2020
O dólar comercial acumulou queda de 6,6% nesta semana, emendando a terceira semana seguida de desvalorização e fechando abaixo de R$ 5 pela primeira vez desde 26 de março. A Bolsa subiu 8,28% na semana. O que explica esses resultados, semanas após a Bolsa despencar e o dólar bater recorde atrás de recorde, chegando a beirar R$ 6? De acordo com especialistas, o otimismo com a reabertura gradual da economia em vários países e a injeção de dinheiro nos mercados são os principais fatores que explicam a queda do dólar e a valorização da Bolsa. Além disso, eles avaliam que o cenário político interno foi mais calmo nesta semana, com a aproximação entre o governo e deputados de partidos do Centrão.
Os mercados têm sido impulsionados pelo otimismo em relação a uma retomada da atividade nas principais economias, como Alemanha, França e Reino Unido, devido a relaxamentos graduais das restrições contra o coronavírus. Segundo analistas da Easynvest, mesmo que os problemas ainda não estejam resolvidos e que haja risco de uma segunda onda de contágio, há expectativa de que o pior da crise econômica do coronavírus já tenha passado. Os dados sobre o mercado de trabalho nos Estados Unidos em maio, divulgados hoje, também reforçam essa avaliação positiva. O relatório mostrou que a taxa de desemprego na maior economia do mundo teve uma queda inesperada em maio, passando de 14,7% em abril para 13,3%. As expectativas de analistas ouvidos pela agência de notícias Reuters eram de que a taxa subisse para 19,8%.
Ao mesmo tempo, continuam no radar dos investidores as medidas de estímulo adotadas por diversos países. Analistas do Bradesco destacam, por exemplo, a ampliação do programa de estímulos feito pelo Banco Central Europeu para enfrentar a crise do coronavírus, para um total de 1,35 trilhão de euros (R$ 7,57 trilhões). O governo alemão também aprovou um pacote de 130 bilhões de euros (R$ 729 bilhões) em gastos públicos, e há a expectativa de pacotes adicionais de estímulo nos EUA, que podem chegar a US$ 1 trilhão (R$ 4,97 trilhões). Medidas como essas aumentam a liquidez global, ou seja, aumentam o volume de dinheiro disponível para investidores. Parte desses dólares acaba vindo para o Brasil. Com mais dólares aqui, a cotação da moeda tende a cair.
Além disso, como as taxas de juros no mundo todo estão em níveis muito baixos, ativos mais arriscados, que podem render mais, atraem esse capital, como o mercado de ações. "Com dinheiro em abundância em um cenário de juros baixos no mundo todo, digamos que o dinheiro parado 'queima' na mão", afirmou Matheus Soares, da Rico Investimentos.
Ações de empresas brasileiras acabam sendo favorecidas. Como a Bolsa brasileira caiu muito ao longo da crise, chegando a acumular desvalorização de 45% no ano, a percepção é de que as ações agora estão baratas.
"O mundo não para de colocar dinheiro no sistema. Fundos de investimento dedicados a mercados emergentes, caso do Brasil, voltaram a captar. Depois de o dinheiro ter ido para as Bolsas norte-americanas, depois para as europeias, chegou agora a vez das Bolsa dos emergentes", afirmou Roberto Motta, responsável pela mesa institucional de futuros da Genial Investimentos.
No Brasil, apesar de o número de infectados e de vítimas fatais do coronavírus não parar de subir, os investidores também estão otimistas em relação à retomada da economia, com planos de reabertura das atividades em algumas cidades. Em relação ao cenário político, analistas avaliam que a semana foi mais calma. "Tivemos uma semana de mar de almirante", afirmou Álvaro Bandeira, economista-chefe do banco digital Modalmais. "Não aconteceu nada surpreendente. O presidente Jair Bolsonaro até pediu para os apoiadores dele não irem às manifestações".
Denilson Alencastro, economista-chefe da Geral Asset, destacou a aproximação do governo com deputados de partidos do Centrão. Nas últimas semanas, o governo ofereceu cargos a esse grupo, visando obter apoio a projetos de seu interesse na Câmara. "Tivemos uma guinada nas últimas semanas, porque estávamos num cenário em que o governo estava com problemas, houve saída de ministros, confusão política. Agora, o governo começou a ficar mais próximo do Centrão", disse.
Para Motta, "o governo ter apoio do Centrão é fundamental para o Brasil retomar as reformas que o país precisa. Sem falar que também diminui bastante o risco de impeachment, que assustou o mercado", afirmou. Tito Gusmão, CEO da Warren Gestão de Patrimônio, também destacou o risco menor de impeachment. "Não que o mercado goste ou não de Bolsonaro, mas um processo de impeachment seria algo demorado, tenso e que traria muita volatilidade", disse.
Os desdobramentos políticos, porém, continuam sendo vistos como motivo de cautela, com expectativa de manifestações nas ruas no fim de semana. O presidente Jair Bolsonaro voltou a chamar os manifestantes de grupos pró-democracia contrários ao seu governo de "marginais" e "terroristas" nesta sexta-feira, e pediu que as forças de segurança do país atuem contra as manifestações marcadas para domingo se os grupos "extrapolarem" os limites.
Apesar das quedas recentes, o dólar acumula alta de 24,29% em 2020, afetado por um cenário de incertezas políticas, juros baixos e fortes impactos econômicos causados pela pandemia de coronavírus. Para os mercados, ainda é difícil dizer se o real deve manter a recuperação das últimas semanas. Riscos negativos, como a possibilidade de uma segunda onda de infecções por covid-19 e incertezas políticas, permanecem no horizonte. A Bolsa acumula queda de 18,17% no ano.
FONTE: Do UOL, em São Paulo 05/06/2020 17h20 SAIBA MAIS EM: https://economia.uol.com.br/cotacoes/noticias/redacao/2020/06/05/dolar-bolsa-mercado.htmGaleria de Fotos